Infarto Agudo do Miocárdio
Mais conhecido como ataque cardíaco, o infarto agudo do miocárdio (IAM) é um processo fisiológico que pode levar à necrose de parte do músculo cardíaco, devido à falta de oxigênio e nutrientes, causada pela diminuição do fluxo sanguíneo coronariano. Este, habitualmente, ocorre por uma oclusão na artéria, em geral devido à formação de um coágulo sobre uma área previamente comprometida por aterosclerose.
Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), as doenças cardiovasculares, que incluem infartos, derrames e acidentes vasculares cerebrais (AVC), são a maior causa de mortalidade em todo o mundo. No Brasil, em 2016, o número de mortes causadas por doenças do coração e aparelho circulatório chegou a 340.284 (28,35% do total). Daí a importância em desenvolver medidas mais eficazes de prevenção e rápido diagnóstico. Todos esses dados mostram que esse número de mortes está diretamente relacionado ao estilo de vida, como uma dieta rica em alimentos ultraprocessados e sedentarismo. Dentre os fatores de risco o tabagismo se destaca, estima-se que cerca de 25% das mortes causadas por doença coronariana sejam por conta do cigarro. Além do cigarro, a obesidade, o aumento dos níveis de colesterol, diabetes, hipertensão arterial, consumo de álcool, o sedentarismo e o estresse contribuem para ocorrência do infarto. Outros fatores, tais como a idade, predisposição genética e depressão, também podem afetar o funcionamento do organismo, causando uma pré-disposição para a doença.
O diagnóstico do infarto é feito de maneira indireta, através dos sintomas do paciente, das alterações no eletrocardiograma e da avaliação laboratorial. A utilização da medição da creatina quinase total (CK total) e da CK-MB pelo método com inibição por anticorpos está disponível para praticamente todos os laboratórios brasileiros e latino-americanos, oferecendo grandes facilidades operacionais e baixo custo. Nosso objetivo é descrever uma estratégia de aplicação diagnóstica para permitir a utilização efetiva dessas duas enzimas.
Elevação das Enzimas no Plasma
Após o IAM, ocorre uma fase inicial com duração de 6 horas, durante a qual as atividades das enzimas séricas se mantêm dentro dos intervalos de referência. Essa fase inicial pode ter menor duração nos casos de infarto com grandes dimensões. Após essa fase inicial, as atividades enzimáticas se elevam rapidamente com magnitude proporcional à extensão da necrose miocárdica.
A CK-MB é a primeira enzima a se elevar, chegando a um pico nas 24 horas após o início da dor precordial e, devido a sua curta meia-vida, retorna aos níveis pré-infarto entre o segundo e terceiro dia após o início dos sintomas. A CKMB tem uma elevação média de 10-25 vezes o valor superior do intervalo de referência, atingindo 240 – 600 U/L. Esses valores podem ser reportados como percentuais da CK total (CK-MB*100/CK total), sendo usualmente menores que 6,0% nos indivíduos não portadores de IAM. Após o IAM, os valores podem atingir até 20% da CK total em decorrência do método da extensão do dano ao miocárdio e da localização da lesão.
A CK total pode se elevar simultaneamente com a CK-MB ou um pouco depois, e chega a um pico entre 18 e 30 horas depois da dor precordial, retornando ao intervalo de referência entre o terceiro e o quarto dia.
A atividade média após o IAM pode aumentar 7-12 vezes o valor superior do intervalo de referência, atingindo 1.400-2.400 U/L.
Aplicação das Enzimas no Diagnóstico
A utilização racional da atividade enzimática de CK total e CK-MB para exclusão ou diagnóstico do IAM requer uma estratégia diagnóstica estritamente baseada na obtenção de amostras de sangue no intervalo de tempo em que se espera que essas enzimas estejam elevadas. Vários estudos têm demonstrado que o intervalo de tempo em que a probabilidade de se encontrar elevação das enzimas ocorre entre 10 e 20 horas após o início da dor precordial. As amostras de pacientes com suspeita de IAM devem ser obtidas preferencialmente após 10 horas e após 16 horas com intervalo entre as amostras de 4 a 6 horas. Isso significa que medições mais precoces dessas enzimas contêm um considerável risco de resultado falso negativo, que pode transferir para o médico clínico uma falsa sensação de segurança e levar a decisões incorretas. Como o diagnóstico de IAM pode ser definitivamente excluído utilizando as atividades enzimáticas no intervalo entre 10 e 20 horas do início dos sintomas agudos, é fundamental obter as amostras de sangue somente dentro desse intervalo de tempo.
Os métodos de ensaio para CK total e CK-MB devem ser rastreáveis ao método de referência da IFCC (International Federation of Clinical Chemistry and Laboratory) e as medições devem ser realizadas a 37 °C. O limite superior de referência dos resultados de CK total é 150 U/L para mulheres e 200 U/L para homens. Para CK-MB, o limite é 24 U/L ou < 6,0%.
Utilização Diagnóstica das Atividades Enzimáticas
A estratégia para interpretação dos resultados das medições em amostras obtidas no intervalo de 10 a 20 horas baseia-se nas seguintes premissas:
– Quando a atividade da CK total nas duas amostras for menor que o valor superior do intervalo de referência, a exclusão do diagnóstico de IAM pode ser confirmada com 99% de probabilidade.
– Todos os pacientes com atividade da CK total maior que o valor superior do intervalo de referência, que pode incluir 30% de falsos positivos para IAM, deverão ter a atividade da CK-MB medida nas amostras de 10 a 20 horas (ver algoritmo diagnóstico).
– A associação de CK total elevada, maior que o valor superior do intervalo de referência para homens e mulheres, e CK-MB maior que 6% da CK total até um valor de 20% pode confirmar um diagnóstico de IAM com 98% de probabilidade. É importante enfatizar que a atividade da CKMB no músculo cardíaco é 1/5 da atividade total da CK total. Portanto, no IAM, uma CK-MB plasmática não pode atingir valores mais elevados que 20% da CK total.
Macro CK
A macro CK, também denominada CK atípica, é um complexo de CKBB ligada a IgG, IgA ou um complexo polimérico de CK mitocondrial. Essas formas de CK não são inibidas pelo anticorpo anti CK-M e geram resultados como se fossem CK-MB. Tipicamente, a macro C pode representar 12 a 57% da CK total, além de estar associada a valores de CK total dentro do intervalo de referência, apresentando um comportamento estacionário que não se modifica significativamente no intervalo entre 10 e 20 horas, como ocorre de forma dramática com a CK total e CK-MB no IAM.
A macro CK tem uma prevalência de 3% na população geral, podendo chegar a 5% em mulheres idosas, sendo significativamente rara em pacientes com IAM. A presença de macro CK pode ser identificada na maioria dos casos utilizando o teste da termoestabilidade com determinação da enzima antes e depois da incubação por 20 minutos a 45 °C. Uma atividade residual maior que 55% indica a presença de macro CK. Pode-se considerar que, utilizando os critérios de exclusão da macro CK, sua contribuição como fonte de erro é menor que 0,5%.
A macro CK tipo 1 constitui uma variação da normalidade, mas podem estar relacionadas à quadros de miosite/processo autoimune. Já a macro CK tipo 2 é um complexo oligométrico de origem mitocondrial com um certo grau de associação com neoplasias. Outras causas de elevação de CK-BB (tipo 1) são usos de esteroides sexuais, atividade da vitamina D e seus metabólitos, estrogênio e PTH, glicocorticoides, isquemia e reperfusão hepática, uropatia obstrutiva e azotemia.
Vale lembrar que os testes laboratoriais atualmente utilizados detectam e quantificam o percentual de macromoléculas em relação à concentração de CK Total, porém não diferenciam o tipo circulante.
Conclusão
A utilização de uma estratégia bem definida para o diagnóstico do IAM pode contribuir para obter resultados eficientes tanto para exclusão definitiva do evento como para confirmação do IAM com 98% de probabilidade.
A medição da atividade da CK total e da CK-MB pode ser realizada rápida e eficientemente com métodos bioquímicos associados com imunoinibição. Quando se utilizam estratégias apropriadas para obtenção de amostras nos tempos onde o valor preditivo dos testes é mais significativo, obtêm-se resultados de especificidade e sensibilidade clínicas de significativo valor diagnóstico.
As macro CK, que podem ser fonte de resultados falso positivo, excedem o intervalo de 6-20% da CK total, tipicamente associado com IAM. Adicionalmente, a CK-B e as macro CK não apresentam dramática elevação e redução nas primeiras 48 horas, características do IAM. Elas tendem a se manter constantemente aumentadas ou se modificam lentamente. Além disso, a maioria das formas atípicas é encontrada em pacientes com a atividade de CK total abaixo do valor superior do intervalo de referência. A utilização de critérios para excluir os efeitos de falso positivo da macro CK contribui significativamente para a exatidão do diagnóstico de IAM.
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